O Diário de Mogi das Cruzes

Sérgio Buarque de Holanda 1902/2002

José Sebastião Witter

Neste ano de 2002, se estivesse vivo, o professor Sérgio Buarque de Holanda completaria cem anos de vida. Digo, mais uma vez, acho que não gostaria de ser um homem do século passado e, muito menos, gostaria de ser um velhinho de cem anos. Sérgio era sempre muito alegre, quase moleque, para envelhecer e ir perdendo o brilho dos olhos e a euforia de cada instante. Embora faça muita falta, nos deixou no tempo certo, num abril de 1982, portanto, há quase vinte anos.


Falar de Sérgio Buarque de Holanda é falar do incomparável historiador brasileiro, que ele, sem dúvida, o foi. Não estou dizendo que foi o melhor, nem o maior, só estou afirmando que foi incomparável, em todas as suas qualidades e também defeitos.

Todos nós, que num determinado momento, fomos alunos da Universidade de São Paulo e cursamos História passamos pôr suas aulas e o consultamos em sua sala de professor catedrático. Os tempos eram outros e professores que, como ele, defenderam a tese de Cátedra eram os homens diferenciados de todas as Universidades Brasileiras. Eu vi o Dr. Sérgio, como outros o chamavam, e, dizem, ele gostava mais do doutor que do professor, defendendo sua cátedra com o livro Visão do Paraíso, que é, sem dúvida, o seu livro mais erudito. Desde aquele momento pude entender o que seria ser assistente desse catedrático. Nunca me decepcionei com a sua conduta, pois tive a felicidade e o privilégio de ser um de seus assistentes. Era catedrático, porém não era um déspota como tantos outros. Abolida a cátedra, nós o continuamos considerando nosso catedrático. Ele mesmo questionava essa sua posição e pôr isso mesmo nunca deixou de ser o formador de discípulos, um criador de uma verdadeira Escola de Historiadores. Sérgio formou muita gente em todo o Brasil e no exterior. Marcou época.

Quando se fala dele é preciso lembrar de, pelo menos, mais três obras, além de Visão do Paraíso. São elas Raízes do Brasil, Caminhos e Fronteiras e Monções. Cada uma delas tem sua própria trajetória e cuida de temas pouco tratados quando o mestre os concebeu e publicou. Aquele que nasceu um clássico, como afirma o professor Antônio Cândido de Melo e Souza, Raízes do Brasil, é obra dos anos trinta do século XX e se constitui em uma obra reveladora do Brasil. É atual ainda hoje e deve ser lida com a atenção que merece. Caminhos e Fronteiras também inaugura uma nova fase de nossa historiografia porque o historiador vai trazer para a discussão os traços materiais de nossa formação e, com Monções, o mestre vai mostrar a grande diferença entre o movimento bandeirista, desbravador e predatório, e o movimento monçoeiro, comercial, plantador de povoações e vilas e, também abastecedor das regiões auríferas, principalmente aquelas localizadas em Goiás e Mato Grosso. Sérgio Buarque de Holanda sempre foi um inovador e não pode ser esquecido pelo tanto que fez pela nossa historiografia. Mas Sérgio também contribuiu sobremaneira para a crítica literária. É, acima de tudo, um homem que sabe escrever e cada artigo ou livro dele é uma aula efetivamente.

Falemos um pouco do professor e do homem que ele foi. Professor em todos os momentos de sua vida e não somente quando estava em sala de aula. Cada palavra, cada gesto, cada ação, tudo ensinava. Como figura humana era, também excepcional. Quem o conheceu sabe do que estou falando. Nesta hora me lembro bem de seu comportamento boêmio, de sua firmeza de caráter e de sua sempre moderna atuação política. E, acima de tudo, era capaz de ser amigo. Amigo daqueles que se pode contar nos cinco dedos de uma mão. Sou suspeito pôr tudo que digo dele ou sobre ele, falando ou escrevendo, porque devo a ele a minha carreira acadêmica e a minha formação como professor de História, que ousa escrever, neste espaço, todas as quartas-feiras. E, hoje, é dia de Ciência ao Meio - Dia, na UMC, quando falarei sobre Sérgio e, aproveito esta oportunidade, para convidar todos os meus leitores e amigos para esse encontro com o historiador e professor Sérgio Buarque de Holanda.


FONTE: O Diário de Mogi


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